Action Arts TV - Music And Player

Sem Pressas

Entra em todas as portas! Se não tiveres tempo hoje, regressa quando te apetecer ou precisares. Cada texto é uma audição, uma sala em que te encontras só em meditação, e cujas paredes vão progressivamente mudando de cor para auscultares o centro do teu Ser. A Beleza transcendente de um encontro com a tua própria consciência. Abraços. Germano Vaz.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

BUCKINGHAM PALACE




A Sua Majestade Rainha Isabel II
De Inglaterra
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Londres, era para mim uma espécie de mito. Um universo distante e inacessível, desde que dei por mim ao cimo da Terra. Venho de uma micro-colónia industrial inglesa, instalada no Concelho de Mértola no alvor do Século XIX, para dar lugar à exploração dos metais e outros elementos nos subterrâneos da Mina de S. Domingos.
Os mandatários da antiga Roma, enviados para o controlo do Ocidente da Ibéria, depressa se aperceberam que o Morro de S. Domingos escondia enorme potencial de riquezas. Escavaram galerias que ainda hoje são visíveis a partir dos observatórios turísticos instalados recentemente no sítio pela Câmara Municipal de Mértola, sobre o gigantesco patamar de escória e resíduos, deixados ao deus-dará pela magnânima administração inglesa.
Eu vi como tudo aquilo funcionava. Por algumas vezes vim de casa, situada a seis quilómetros da mina, de cesto na mão com a refeição de almoço, para entregar ao meu pai. Que por último trabalhava à boca do túnel no controlo da corda-sem-fim. Um espesso cabo de aço multi-filar onde eram enganchadas as zorras, pequenos vagões que circulavam sem parar, entre as profundezas negras da Terra e o Cais de transfega. Primeiro dos pontos para o acesso das substâncias minerais aos pólos siderúrgicos da Grã-bretanha.
Por tanto… Almocei por algumas vezes no ambiente de trabalho dos mineiros. Gravando na memória dos meus sete e oito anos, os sons e as imagens que ainda não vi reproduzidos em qualquer minuto de todo o volume de filmes e documentários até hoje realizados sobre o enorme complexo.
Inglaterra era pois um mundo distante e inacessível, desde então e até há pouco tempo. Até que um dia, um conjunto de ex-alunos meus se foram fixando um a um, no Canal de Música para jovens, MTV, situado em Camden Town , na ala norte de Londres. Comecei então o meu per-curso regular desde 2005 entre Lisboa e Londres e deste modo, os meus alunos me têm retribuído a dádiva da experiência transmitida, em alojamento, refeições e aprendizagem da geografia de Londres, e já também, de muitos outros pontos do país, nesta minha espécie de tirocínio sobre a Real Sociedade Inglesa.
Embora, tenha vindo ao mundo enquadrado numa figura de Estado regulada por um doentio e sarcástico sistema republicano, não sinto qualquer adversidade de simpatia, pelas monarquias, sempre que estas saibam interpretar a lição das formigas e das abelhas. E mais do que fazer ressurgir ou crescer qualquer império, conduzir as suas populações rumando ao grande destino das humanidades, em que todos participem com o seu melhor, ninguém se torne abastado em desmedida proporção, e todos tenham direito à oportunidade e ao suficiente. Pois que, dado o tempo médio de vida na espécie humana, mais não será necessário, para que todos possamos sair um dia deste mundo, livres de qualquer revolta, porque um outro nos devorou ou absorveu indevidamente parte ou a totalidade do nosso quinhão.
Precisava de ver. De observar em pormenor os materiais e contornos dos portões de Sua Majestade Rainha Isabel II. O Palácio de Buckingham, inicia os seus domínios geográficos logo a partir dos enormes arcos em Trafalgar Square. Passados estes dois imponentes arcos, temos quarenta minutos a pé, em linha recta até ao Palácio. O que fica desta enorme alameda sempre ladeada por frondosos jardins, é de que é o local ideal para as paradas e cerimónias militares. De facto, todo o perímetro de jardins do Palácio está disponível e aberto ao público permanentemente. A ala mais exuberante é a dedicada à província do Canadá. Aos portões que me levaram ali, já os de acesso às zonas de actividades oficiais e residências, transportei através da observação e do tactear o aço, o cobre e o bronze poderosos e espessos, uma espécie de memória, em devoção e apreço aos que recolheram estes metais das profundezas de S. Domingos. Dois soldados guardiões, imóveis como estátuas, só interrompem aquela ausência de movimento, quando substituídos por outros, ao fim de duas horas. Não desisto deste filme e quiçá até, se um dia consigo entrar ali dentro… Enquanto em Mértola se observam os restos da velha mina inglesa a partir dos miradouros assentes nas escórias, e diante de águas ácidas por deter e controlar, eu procuro uma oportunidade para dialogar com a Primeira Soberana do Palácio de Buckingham.
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Copyright: Germano Vaz - World Arts Gallery - Sociedade Portuguesa de Autores - 11/2009.
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domingo, 22 de novembro de 2009

Em Nome do Pai...


Em Nome do Pai
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Que diria Jesus de Nazaré se, ao que nos era proposto a sua viva presença tivesse retornado à Terra, ou na verdade, enraizada no coração dos homens… Estremeceria, talvez de surpresa, de espanto e de arrependimento. Pelo derramar do seu talento intransponível, da sua dedicação e sofrimento. Por paixão, que no terreiro planetário se esfuma atrás de um milhão de argumentos, sempre repetidos no reinventar da miséria da filosofia dos que por cá ficaram, e em muitas mais desculpas procuram depurar nos oratórios dos fóruns, essa provocação universal que espraia o vazio sobre as sensibilidades e o pensamento, entre a mensagem primordial e todo o tempo de mais de dois milénios, desde, mesmo antes do seu assassinato, até aos presentes dias.
Escolhi Mértola como cenário, porque atrás daquela luz, bem podia estar o pátio em que o Divino Complacente reconfortava alguns dos seus seguidores mais sofridos. Enquanto sua mãe o procurava para o alertar sobre os perigos eminentes que ele corria. Aliás, perseguido e ameaçado sempre, desde Herodes a Pôncio Pilatos. Um dos seus irmãos, de quem não via bem o rosto mas que me parecia ser Tiago, junto a ela, dizia-lhe: Vês…! Olha para ti e não reage. Nem sequer te reconhece. É como se não existisses. - Como podes tu julgá-lo dessa maneira? Só o amor que o envolve àqueles sofredores o pode ter obrigado a ignorar a nossa presença… E nisto o irmão de Jesus afasta-se como se não corroborasse das palavras e certezas de sua mãe. Maria, sozinha então, voltava a mostrar-se a Jesus a uns trinta metros de distância e depois, de novo se ocultava atrás de uma esquina. Só por uma vez, Jesus cruzou o seu olhar com o de sua mãe, e nem aí deixou transmitir qualquer sinal que lhe dissesse que podia esperar por ele. A imensa fila de desalentados tinha reduzido de tamanho e um dos seus assistentes avisa-o de que devem seguir para a praça da cidade onde o aguardava uma enorme multidão para o ouvir. Maria, tinha então abandonado a espera e já retomava o caminho de volta. Sabendo das convicções de Jesus, conhecendo a Natureza da sua infinita generosidade, regressava a casa firme do seu amor, mas não sabendo esconder alguma tristeza por o filho não a ter recebido. Por não poder transmitir-lhe as suas inquietações de mãe, acerca das perseguições acéfalas que lhe movia o governador da Judeia.
- Mãe…! - Maria interrompeu os passos. A expressão do seu rosto alterou-se. De uma nostalgia contida para uma luminosidade de esplendor único, só atribuída à inocência. E voltou-se para ele já a sorrir. Jesus deu mais uns passos e chegou até ela. Nunca os olhos de Jesus libertaram tanto brilho. Nunca o seu rosto disse amar tanto como naquele instante. Abraçou-a e disse-lhe: - Tenho de ir. Não posso interditar o caminho. A multidão espera-me na praça. Estão ansiosos por me ouvir. Maria recuperou as suas forças e ficou a olhá-lo serenamente, enquanto Jesus se dirigia para a Ágora. Para além de saber que aquele era o último discurso de Jesus, Maria sabia também que a sua entrega plena àqueles a quem aliviava o sofrimento momentos antes, foi o único motivo da espera em que ele parecia nem sequer reconhecê-la. Este foi o último abraço, o instante em que ela viu o filho em liberdade pela última vez. Só através do amor entregue neste momento, é que Maria pôde superar a dor tremenda que lhe fora causada por todo o posterior sofrimento do filho.
Devo poder contar apenas pelos dedos das mãos, as sensibilidades que em todo o Universo conhecido, agiram perante os outros em conformidade com estas orientações. Tudo o que a governança do Mundo, da escala mais medíocre á mais descomedida possa dizer para justificar a ausência de solidariedade, que espelha o açambarcar de riquezas acumuladas, na posse dos imperadores da actualidade, desde as seis corporações de banqueiros que controlam o dinheiro de todo o Mundo, até á politicazinha de paredes-meias com os nossos casebres, são entretenimentos para suster a razão dos menos remunerados e legalizar o descalabro, o desvario que sujeita a Humanidade à proibição de ter esperança e de ter Justiça. Até da esperança, as habilidades da retórica e da propaganda fazem alegorias e vitórias. Para logo a seguir, transformarem os sonhos que fazem parte da nossa estrutura ancestral, em contentores de vácuo e de ruína.
Onde estão as décadas de promessas contínuas para o debelar das crises? Onde estão os Séculos de experiência colhida dos horrores das colonizações e das guerras? Onde está o conteúdo, o significado de igualdade reclamado no ímpeto poético das Revoluções? Onde está o poder da arte que sustenta as ogivas das catedrais? Talvez seja só poder, porque a Arte reside na fé onde se potencia o espírito de cada Ser. Onde está a capacidade dos reverendos perverterem, ou mesmo só contornarem a fidelização cega ao seu imperador, e colocarem-se em campo para seguirem o chamamento da pureza e da dignidade do espírito como verdadeiros missionários...?
De repente, parece que o Mundo deixou de ter fundo-de-maneio a circular… Aprisionaram-no no pragamatismo da crise. As televisões abrem as notícias com espectáculos de pavor, para que o intervalo dos anúncios renda mais do que o do dia anterior. Os Canais das novelas embalam os cérebros para as realidades saberem a ficção. A cidade do cinema da Califórnia propõe aos jovens de todo o Mundo, uma estrutura de pensamento, que exala violência e distânciamento da solidariedade. Uma frieza vítria e perigosa...! Quantas escolas são metralhadas em cada ano? Onde nasce o desnorte que produz tal aberração? Quem arrecadou o dinheiro de repente…? Quem é que fabrica marginais...? Por onde passa a retoma…? Pela inflação, ou pela deflação…? Qual é o índice de sub-escravos postos na rua em cada dia...? Qual é a peste que vai provocar a próxima pandemia? Que dirá a isto a Justiça, ou ela é formada sob o manto de quem manda...? Jesus e Marx fundiram-se em José Afonso... Quem deu por ela...? Já tem cama e sepultura, toda a Terra… Pai, perdoa-lhes. Que eles não sabem o que fazem…!
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Copyright: Germano Vaz - World Arts Gallery - Sociedade Portuguesa de Autores - 11/2009
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